quarta-feira, 22 de abril de 2015

Projeto arquitetônico: obra autoral ou não?


Amplos são os debates sobre o Direito de Autor em obras arquitetônicas e ainda mais profundas e complexas são as implicações que esse debate tem para a vida prática. O modo como se vê o projeto arquitetônico influi desde a etapa da criação de tal até sua efetiva construção, passando por questões como a possibilidade de alteração do projeto do arquiteto por parte do engenheiro e até mesmo a discussão sobre se o projeto e o "prédio" constituem obras diferentes ou iguais.

Com o objetivo de contribuir para o debate e elucidar algumas questões, pretendo analisar os requisitos para a proteção de uma obra e se um projeto arquitetônico se enquadra neles. o artigo 7º, caput e inciso X da lei 9.610/98 assim dispõe:
Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: X - os projetos, esboços e obras plásticas concernentes à geografia, engenharia, topografia, arquitetura, paisagismo, cenografia e ciência;
Percebe-se no caput do artigo as três condições necessárias para que se proteja a obra, quais sejam ela ser uma expressão intelectual criativa e que, sendo essas cumpridas, o projeto arquitetônico seria considerado como obra. Cumpre agora olhar os quesitos mais à fundo.

A parte "intelectual" envolve a necessária intervenção humana no projeto. Esse quesito não impede a realização do projeto em programas como o AutoCAD, por exemplo, porém, exclui da proteção aqueles gerados totalmente por computador.

A criatividade é um quesito de complexa avaliação objetiva, tendo de ser avaliado caso a caso. José Alberto Vieira, jurista português, comenta que a criatividade vai além do lugar-comum, sendo indicativo da individualidade da pessoa. Implica o transcender da banalidade para determinar um grau de realização expressiva. Desse modo, a pergunta a ser feita é se é possível de se observar traços da individualidade do arquiteto no projeto.

Por fim a "expressão", a qual deixei por último por julgar ser o tópico mais polêmico. Deve-se entender, primeiramente, que a obra autoral não é o objeto material na qual ela se encontra, servindo esse apenas como meio de divulgação da obra ao público. Sendo a obra, portanto, um bem incorpóreo o projeto arquitetônico é o modo como a ideia do arquiteto se expressa ao público, mas não é necessariamente o único. 

Assim, a transcrição desse projeto em um "prédio" não significa uma obra nova, mas sim a continuidade de um processo intelectual e criativo iniciado com o projeto e eventualmente sendo aplicado na prática, de modo que a construção seria outra forma de expressão da ideia originalmente concebida pelo arquiteto.

Com esse breve texto não pretendo esgotar a discussão sobre o projeto arquitetônico e sua proteção ante o direito de autor. Quis esclarecer alguns pontos que eu achava mais relevantes e trazer o debate para este blog, aproveitando para perguntar a opinião dos leitores sobre esse assunto.

2 comentários:

  1. Prezado Lukas
    Como arquiteta projetista, concordo com suas afirmações.
    Complemento sua ideia ao esclarecer que, os projetos que atualmente são feitos usando o software Autocad, não prescindem do ser humano, o projetista, pois são dependentes deste, não realizando o projeto por si.
    Um projeto é representado, minimamente, por plantas baixas (representação dos ambientes como se o observador estivesse pairando no ar, olhando ao nível de 1,5m de altura de cada piso); cortes (visão dos ambientes como se estivesse olhando lateralmente, e cortando com um plano vertical, perpendicular – 90 graus com o solo); fachadas (visão exterior da construção); perspectivas (visão tridimensional da construção) em diversos ângulos internamente ou externamente.
    Esse software já está, dentro do âmbito técnico, semi-superado por outros softwares mais avançados, em que se projeta já em 3D (espacialmente) e, ao projetista alterar um elemento constante do projeto, este é alterado pelo programa nos demais componentes (em planta, em corte, etc) como acontecec com o Revit ou Arq3D, por exemplo. Mas mesmo esses, não prescindem do operador, o projetista.
    Esses novos softwares, possuem a capacidade de mostrar mais facilmente deficiências no caso de compatibilização de projetos (arquitetônico com estrutural, instalações, etc.), como, por exemplo, sobrepor a planta arquitetônica de um pavimento com o projeto hidrossanitário, elétrico e constatar-se a ocorrência de excesso de dutos em determinados locais, normalmente sobre o forro da construção, ou cruzamentos indesejados, que, com Autocad, podem passa despercebidos. Mas, mesmo esses problemas sendo mostrados pelo software, precisam do projetista para sua percepção e intervenção para sua resolução, o software, por si só, não avisa, decide e não propõe solução. A atividade criativa, a pesquisa, e a troca de experiências dos diferentes projetistas (arquiteto, engenheiros civil , eletricista, mecânico, sanitário, etc) , não apenas de um só, é imprescindível no resultado, qual seja, o projeto da construção a ser executado.
    Ainda, a criatividade de um autor é resultado de seus estudos, pesquisas, além da interação com demais pessoas, nem sempre técnicos, mas muitas vezes, usuários das edificações, que dão importantes depoimentos de avaliação pós-ocupação ao arquiteto, que pode incorporar novas perspectivas e soluções aos seus projetos.

    Ana S Bortolotto

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    1. Agradeço pelo comentário Ana. Esse tipo de feedback, de quem atua na área, só ajuda a aprofundar a discussão do tema.

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